quarta-feira, 12 de janeiro de 2011 | By: Daíza de Carvalho

Após um ano, militares limeirenses relembram terremotos no Haiti

Daíza Lacerda

Foi com os olhos vermelhos, quase marejados, que o soldado limeirense Tomas Dalton Marciano, 25, se lembrou do que passou há exatamente um ano, quando servia em Missão de Paz no Haiti e presenciou o terremoto que abalou a capital Porto Príncipe e a emoção dos sobreviventes à tragédia. Marco Carneiro, 24, é outro limeirense que lidou com a situação caótica no país.

"Aprendi a valorizar mais a minha vida e a dos outros e pude perceber que o pouco que alguns têm, já é muita coisa", resume Dalton sobre a experiência que passou às vésperas de voltar para casa, em Limeira, no fim dos seis meses de serviço.
"Antes dos terremotos, atuávamos contra a violência e tráfico de drogas. Havia a área vermelha em que nem o Exército entrava, mas estava numa situação relativamente melhor do que em outras épocas", descreve. Se o local já possuía pouca estrutura, o sismo intensificou a situação de miséria.
Já Carneiro diz que, com a experiência, hoje sente-se mais completo como ser humano. "São coisas que marcam e que passamos a ver a vida de outra forma. Aprendi mais, nunca sabemos de tudo nessa vida", declara.
A pior experiência, para ele, que atuava na equipe de enfermagem, foi ter de fazer necropsia nos corpos de 21 amigos. "Tive muito medo de não voltar para casa, do risco de tsunami e de não conseguir cumprir a missão".

MISSÃO
"O que mais me marcou foi que, com a perda de militares, a prioridade era de ajuda ao contingente. Em todo lugar todos precisavam, mas era difícil passar por uma pessoa pedindo socorro e ter que cumprir a ordem que recebemos", recorda Dalton.
A base onde estava desabou e, apesar de todo o treinamento psicológico, o maior temor ficou por conta da possibilidade de um tsunami, já que estavam a poucas quadras do mar. Deixaram tudo, levando só armamamento.
Dalton trabalhava na cidade de Cité Soleil (Cidade do Sol), a poucos quilômetros da capital. Com o desabamento da base Tebo, onde ficava, foi remanejado à base Charlie, com estrutura à prova de terremotos. Pelas informações que tem com oficiais do Rio de Janeiro, que substituiu o trabalho de seu grupo, muito pouco mudou no país. "Ainda há manifestações e muitos que prometeram ajuda foram embora. Também não se sabe do dinheiro que seria enviado para auxílio na recosntrução".
O foco no trabalho ajudou Carneiro a superar os primeiros momentos, quando nem se sabia ao certo o que estava acontecendo. "Eram muitos feridos e muitas complicações, sem lugar adequado para tratamento. Fazíamos o que podíamos".
Ele se surpreendeu quando voltou ao Brasil e teve noção do tamanho da catástrofe. "Não sabia como as informações chegavam aqui e estando na tragédia não tinha noção da dimensão dos estragos", diz Carneiro, que viu na TV pessoas que cuidou e caixões que fechou.

Jovens poderão voltar ao Haiti e 
servir no Rio de Janeiro neste ano

Os dois jovens podem ser escalados ainda este ano para atuar nas UPPs no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, além de voltar ao Haiti, nos próximos anos.Ambos têm a expectativa de efetivamente retornar ao país, no que as famílias se dividem.
"Quando soubemos, pelo telejornal, eu e meu marido permanecemos num silêncio que era nós e Deus, a única fonte em que poderíamos nos agarrar. Foi muito dolorido, mas uma experiência de fé, até ele conseguir dar notícias", descreve Elizabete Pedro Marciano, mãe de Dalton.
Ela se conforma com a missão do filho, caso retorne mesmo ao Haiti. "É uma missão que alguém precisa fazer. Ele é pronto para isso, não adianta tentar mudar o curso".
Já Carneiro também pretende voltar, o que é uma possibilidade difícil para sua família. "Eles ficam apreensivos, mas está no meu sangue. De certa forma preciso manter um escudo para não desabar, pois são muitas perdas. O jeito é manter o pensamento forte e seguir", diz ele, que se diz cada vez mais apaixonado pela  profissão que lhe faz se sentir útil. "O que posso dizer é que devemos amar a Deus e a todos, da melhor forma possível".
Dalton reflete, um ano depois do que presenciou e no início de um novo ano, que as pessoas devem deixar as diferenças de lado, e se ater ao interior, e não à aparência. "Temos que dar valor ao próximo sem julgar que o outro é inferior. Percebíamos lá que as pessoas precisavam de um olhar, um sorriso, um aperto de mão. Isso era o diferencial. As crianças ficavam alegres com um contato mínimo, o que também nos fortalecia. Às vezes reclamamos tanto de comida, recusando uma verdura, mas lá a refeição deles é argila com sal. A felicidade está tão próxima de nós, e sempre queremos mais".



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