terça-feira, 29 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Quem não casa também quer casa (ou não?)

Alguns filtros preliminares do cadastro habitacional mostram as necessidades de uma geração controversa. Considerando a amostra dos que buscam moradia própria por meio de programa social, são mais numerosas nessa corrida as pessoas entre 31 e 40 anos, além da maioria solteira, conforme mostrou a Gazeta no último domingo.
Se você, como eu, está nessa faixa etária e tentou alguma vez sondar as possibilidades de financiamento da casa própria, já conhece um pouco da dificuldade.
O cadastro mostra várias famílias numa mesma residência buscando a própria, o que abre brecha para um estudo ainda mais profundo, de ordens social e comportamental. São pessoas que continuam com os pais por não conseguirem financiar a casa própria ou porque acabaram se acomodando no conforto da família? Não é absurdo supor, já que somos uma geração de "adultescentes", deixando a casa dos pais cada vez mais tarde. Em alguns casos, nunca, ainda que (ou principalmente) com a chegada dos filhos. Isso devido a inúmeros fatores, entre as regalias e dificuldades próprias dos 30+, atualmente.
Se nessa idade nossos pais já estavam casados e, possivelmente, com uma “renca” de filhos, essa definitivamente não é a primeira das preocupações do "adulto" de hoje. Estudar, viajar, escolher uma profissão. Ou nenhuma, que é o extremo privilégio da geração, vendo os anos passarem de dentro do eterno quarto de infância. Porém, com uma tela para o mundo, em distração que os "velhos" jamais sonhariam ter.
Outro dado do cadastro, o de prevalecer o menor número de filhos entre a parcela analisada, também pode falar sobre essa geração, numa tendência de adiar a maternidade/paternidade. Será um melhor planejamento antes de ter um bebê ou a opção de não tê-lo?
No auge dos benefícios sociais, já ouvi muita gente reclamar que "é mais fácil conseguir casa se tiver salário baixo e um monte de filhos". Não concordo, mas reconheço que solteiros também trilham caminho das pedras na busca da casa própria. Sem a possibilidade de composição de renda, como cônjuges têm, os valores de entrada são estratosféricos, para que as mensalidades caibam dentro de um salário médio. Este certamente é um entrave para deixar o conforto do lar doce lar de infância.
Sou da opinião que todo jovem deve ter a experiência de morar e se virar sozinho, antes de casar, embora eu mesma não tenha vivenciado isso, com os 30 e poucos nas costas. Temos um leque infindável de opções para tantas coisas, mas esse tipo de independência é um desafio para muitos, também sujeitos às leis da economia. Afinal, de que adianta morar fora e ainda depender dos pais para subsistência? Meu palpite é que isso possa mudar a cara da demanda por habitação nos próximos anos. Isto é, se deixar a casa dos pais for, de fato, uma vontade levada adiante.
Também há outro fator: a nova tendência de moradia. Se a expectativa for mudar para uma casa nos moldes das que crescemos, grandes, com quintal, jardim, espaço para gato, cachorro, galinha e papagaio, as mães estão fadadas a nos aturar por tempo indeterminado. Ou prepare a poupança, ou se acostume com a ideia de viver entre pouquíssimas dezenas de metros quadrados, talvez com uma pequena horta na varanda. É o que temos para hoje.

Publicado na Gazeta de Limeira



terça-feira, 22 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Mobilidade custa impopularidade

Brasileiros acham linda a mobilidade urbana dos europeus: poder se locomover de bicicleta, embarcar em trens que funcionam para todo lado, inclusive até outros países. Mas, dentro de casa, a ideia é quase utópica, pois ninguém quer pagar o preço ou abrir mão do conforto do motor particular. Como se aquilo tivesse sido conquistado de graça no Velho Mundo.
Foi só criar ciclovias e ciclofaixas, baixar a velocidade máxima em algumas vias e dar espaço para os corredores de ônibus, que o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), atraiu a ira dos motoristas. Não era para menos: ninguém quer perder espaço quando o disponível já é pouco. É esse egoísmo com o espaço público que torna o trânsito cada vez mais insustentável. O prefeito da capital teve a audácia de adotar medidas impopulares para boa parte da população, que são necessárias ao todo, garantindo espaço a outros públicos que também têm direito a ele. Inclusive ao pedestre, que é o beneficiado nas quedas de limite de velocidade. Vociferaram contra, ainda que nós todos sejamos pedestres.
A mobilidade demanda ações impopulares. Temos as ruas lotadas de carros parados, mais do que carros tentando se movimentar. Na própria redação da Gazeta sentimos o drama. Há dias em que é mais demorada a saída do Centro do que o trajeto pela cidade até bairros mais distantes. Falamos de três quarteirões, cuja morosidade suga mais da metade do tempo até o destino. Não seria mais lógico acabar com as faixas de estacionamento nas vias mais entupidas para otimizar a circulação? O motorista prefere conseguir trafegar quando precisa ou ter onde deixar o veículo? O ônus de arcar com estacionamento seria o menor dos problemas para quem valoriza o tempo.
Numa recente entrevista à Folha de São Paulo, o urbanista colombiano Ricardo Montezuma disse que não adianta tentar convencer os motoristas a trocarem os carros pelo transporte público. É preciso melhorar o transporte público para quem usa, para que este não queira mudar para o carro. Ou seja, o pensamento é induzir ao oposto do que vem ocorrendo nas últimas décadas.
Com raras exceções, o transporte público no Brasil é uma verdadeira tragédia. Em Limeira, determinadas linhas em alguns horários fazem passageiros terem uma travessia que beira ao desumano dada a lotação. Basta conferir in loco. Em outras, é uma maravilha. Todos gostariam de ter um Rapidão em sua região, e sem horário restrito. Por que é tão difícil o equilíbrio?
Limeira também perde o bonde no fator ciclofaixas. Traçado apenas no anel viário não transporta ninguém das periferias para o Centro, em algumas travessias ridiculamente curtas. Isso numa cidade que tem número absurdo de ciclistas, o que poderá ser comprovado hoje para quem quiser se juntar ao 3º Pedala Limeira, com saída às 19h30 do Parque Cidade.
Até existe um plano, que ainda não chegou aos outdoors para maior visibilidade e participação. Escondidinho, lá na página da secretaria de Mobilidade Urbana (http://www.limeira.sp.gov.br/pml/secretarias/mobilidade-urbana), tem no menu, à esquerda, o link do questionário de inclusão do transporte de bicicleta.
Não há ilusões de que será rápido ou fácil. Mas a Europa, pelo menos da mobilidade, pode ser aqui também.

Publicado na Gazeta de Limeira.
terça-feira, 15 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Mudar dentro, para mudar fora

Confesso: nunca fui a mais bairrista das pessoas. Apesar de nascida na cidade, não me considerava "de" Limeira. Não sentia o mínimo de pertencimento por um lugar que, durante muitos anos, parecia só regredir. Enquanto distritos industriais bombavam na região, Limeira não conseguia sequer ter um shopping. Até que um dia, não faz muito tempo, me peguei muito "p" da vida diante de um comentário feito por alguém de fora, desdenhando Limeira. Mexeu com meus brios. Como assim, um forasteiro falando mal da "minha" cidade? Virei bairrista e nem percebi.
No ofício jornalístico, conhecemos algumas entranhas da terrinha. Com o natural interesse em saber mais do que (e de quem) agrega ou desagrega valor ao lugar onde nós vivemos e nossas famílias. Passou a me interessar muito conhecer as nossas origens. Tanto quanto para onde vamos, que é a grande questão da nossa história do cotidiano. Passei a procurar, nos outros, aquele apego que me faltou durante tantos anos. Quem cuida de Limeira? Quem vive por Limeira? O que o "cidadão comum" acha ou pensa?
O que acabou me inquietando mais, entrelaçando questões como essas, foi a situação do nosso patrimônio público - histórico ou não, material ou não. Onde está a memória de Limeira? O que se aproveitou do conhecimento daqueles que testemunharam um tempo que não conhecemos? O que fazemos hoje para preservar o passado e construir o futuro?
Cada vez que vejo um imóvel antigo, como esses da baixada do Centro, sinto uma curiosidade interminável de saber quem e como se vivia ali. Muitos não passam de ruínas que guardam pedaços de uma memória perdida. E o que é uma cidade sem memória, que não preserva e não constrói a sua?
Temos o dever cívico de recuperar e preservar o que firmou as nossas bases até aqui. Não só materiais, mas principalmente as culturais. Porque ninguém precisa tolerar ser tachado de caipira de forma pejorativa por estar no interior do Estado se souber do celeiro industrial que a cidade já foi. E de caipiras também, cujo trabalho proveu café e suco de laranja a mais gente e por mais tempo do que podemos imaginar. Limeira não é mais a terra do café, das laranjas ou da indústria. Hoje, se desenvolve na vocação da produção da joia folheada. Mas vocação não é identidade.
Qual é a identidade de Limeira? O que devo responder como descrever quando me perguntam de onde eu venho? O que diria se tivesse apenas uma palavra para usar?
É algo muito subjetivo, é claro. Nos anos de descrença, meu retrato seria trágico. Hoje, não mais. Teria vários pontos positivos a destacar, mas ainda faltam diferenciais.
Cidades sempre serão instituições em construção. Pessoas também. A retomada dos trilhos do progresso contribuiu para o resgate do otimismo. Mas o ato de participar, não tampouco reclamar, é que fez brotar uma nova cidade ao meu olhar. É como cantou Gabriel, o Pensador: "A gente muda o mundo na mudança da mente / E quando a mente muda a gente anda pra frente". Fica a dica. Avante, Limeira.

Publicado na Gazeta de Limeira.

domingo, 6 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Ouro no Parapan, Odair dos Santos mira Paralimpíadas

Paratleta foi desclassificados no 5.000 m, mas garantiu o pódio nos 1.500 metros

Daíza Lacerda

Os tênis são novos, mas as cicatrizes nos joelhos e canelas denunciam que a trajetória até ali não foi nada fácil. Na pista de atletismo do Sesi, em Limeira, um dos locais que recebem as velozes passadas, o paratleta Odair dos Santos fala do caminho que o levou ao lugar mais alto do pódio nos Jogos Parapanamericanos de Toronto, no último mês. Cego, o velocista conquistou, com o guia Carlos Antonio dos Santos, a medalha de ouro dos 1.500 metros.
Conquistou também o recorde nos 5.000 metros, mas a façanha não foi validada devido à equipe não ter informado no prazo pré-determinado a troca de guias para a prova. Mas, para ele, valeu. "Havia dúvida se eu competiria, por estar retornando de duas cirurgias. E a desclassificação aumentou ainda mais a responsabilidade de conquistar a medalha de ouro, pois os 1.500 metros eram uma prova para a qual eu não estava treinando", contou o paratleta.
Foi o seu quarto Parapan, garantindo ouro em todas. Mas o último é considerado por ele e seu guia o mais difícil da trajetória da dupla, que une forças há cinco anos. "Só tive certeza do ouro mesmo nos últimos metros. Em termos de decisão, foi a prova mais sofrida", conta Carlos.
A sintonia da dupla tem de ser perfeita, sendo que, além de passar confiança, o guia nunca pode chegar à frente, e tem de manter um ritmo que o paratleta responda. E foi essa reação que teve de Odair na reta final, fechando a volta em 4:12:16 e deixando um canadense no segundo lugar, com 4:12:65. O limeirense ainda detém o recorde americano na prova, com tempo de 4:03:66, conquistado em Londres, em 2012.
VIDA DE ATLETA
O foco agora é garantir marcas para defender a cidade e o país nas Paralimpíadas do Rio, no próximo ano. Para isso, tem até maio de 2016 para conseguir a marca de tempo em provas oficiais que garanta a sua vaga. Até lá, mantém a rotina de treinos pelo Centro de Treinamento Limeira Paralímpico (CTLP) com Fábio Breda, que consiste em sessões de tiros de manhã e de tarde, além do trabalho de condicionamento.
Já as lesões, têm de conviver com elas. Antes do Parapan, Odair se recuperava da cirurgia no tendão de Aquiles, que exige pé no freio, mas não estagnação. Sem poder correr, são feitas outras atividades sem impacto, como natação.
A alimentação também dita muito do desempenho dos atletas, mas eles afirmam não abrir mão de algumas regalias. "Me privo de muitas coisas, mas de chocolate não tem jeito!", entrega o velocista. Eles têm determinada quantidade de calorias para consumir no dia, mas confessam que às vezes extrapolam. O índice de gordura não passa dos 5%, quando o dos não atletas pode ser acima de 20%. "Temos de ter alguma gordura acumulada, para não queimar o músculo", justifica Carlos.
DUAS VEZES BRASIL
Pela primeira vez, um atleta brasileiro representou o País no Pan e Parapan. Carlos também disputou os 1.500 na competição convencional, ficando em 9º, com 3:44:37, atrás de outro brasileiro. Também com histórico de lesões, achou que poderia ter feito melhor. A diferença do primeiro colocado foi de cerca de três segundos, uma eternidade quando se fala de atletismo.
E foi justamente a atuação no esporte adaptado que levou o guia às competições oficiais convencionais, por ter de treinar tanto quanto ou até mais do que o paratleta. Afinal, se Odair disparar, ele tem de estar preparado para acompanhar.
Ambos destacam o apoio do Comitê Paralímpico para que esses resultados sejam possíveis, diferentemente do desporto convencional. Também lembram e agradecem um parceiro antigo, a Associação de Mulheres Unimedianas (Amul). "Foi uma das primeiras que nos apoiou e nos apoia até hoje", reforça Odair.
Ainda assim, ambos estão em busca de patrocínio para aumentar o número de conquistas. O contato pode ser feito pelos e-mails dinho1500@hotmail.com e atletabira@hotmail.com.
Eles consideram que promessas precisam de um olhar mais atento e de investimento. "Estou no meio paralímpico há 12 anos, e nunca recebi apoio da prefeitura. Mas também os atletas precisam buscar as oportunidades", conta Odair.
É um caminho sem ilusões, como atesta Carlos. "No começo é difícil mesmo. Mas depois fica mais difícil ainda, para manter e melhorar o nível", relata Carlos. Mas há recompensas. "Buscar a fruta no pé é mais difícil, mas o sabor é outro", concordam.




Retratos de Limeira em meio ao progresso paulista

Parceria com Unicamp traz a exposição "Avante São Paulo!" ao Espaço Engep

Daíza Lacerda

Na década de 1910, tudo o que existia na atual Praça Toledo Barros era uma imensa lagoa e uma charmosa construção, o Theatro da Paz. Pouco mais de uma década depois, seria erguida ali a Gruta, também da Paz, no processo de formação do cartão postal de Limeira. Esses retratos fazem parte da nova mostra do Espaço Cultural Engep, que traz a Limeira parte do acervo do Centro de Memória da Unicamp, em material documentado pela então Secretaria de Agricultura, Comércio e Obras Públicas do Estado, em 1920.
A seleção reproduz a intenção da secretaria de "vender" São Paulo como a terra do progresso e desenvolvimento, tendo apostado nas fotografias como importante ferramenta, principalmente com o recenseamento federal de 1920. É o que explicam os historiadores e curadores da exposição, Ana Cláudia Cermaria e João Paulo Berto.
Nos três espaços do casarão, o visitante conhecerá um pouco da secretaria, que detinha, à época, a responsabilidade sobre os principais serviços e infraestrutura, como viação, comércio, estradas, vias fluviais, iluminação e estradas de ferro, além dos trâmites da imigração. Na segunda, uma amostra dos núcleos coloniais, em retratos usados para atrair colonos, com a promessa de terra próspera, com comida e moradia. No salão principal, os painéis maiores resgatam a Limeira do início do século passado, desde a antiga matriz, hoje demolida, à reunião de figuras da época na Fazenda Morro Azul, como dr. Trajano e o marechal Rondon.
DESENVOLVIMENTO
O acervo do Estado reuniu materiais de inúmeras cidades paulistas, e algumas da região são retratadas na exposição, a exemplo de Rio Claro, Araras, Americana e Pirassununga. Nos retratos do progresso, espaços públicos e privados, praças e escolas mostravam São Paulo na vanguarda do desenvolvimento. E o recenseamento foi uma oportunidade de dar visibilidade a essa transformação, conforme os historiadores.
Preparado cinco anos antes, o recenseamento federal de 1920 previa levantar não somente informações demográficas, mas também a situação econômica do país, por meio das explorações agrícolas e pastoris, além das indústrias. Iniciado em 1º de setembro de 1920, o censo, que era organizado a cada dez anos, seria expressivo para as comemorações do centenário da Independência do Brasil, completos em 1922.
O primeiro dos diversos volumes do censo também está em exposição. Porém, a localização das informações de São Paulo é um mistério, pois o volume não foi encontrado.
A ORIGEM
Após a proclamação da República e a organização dos ministérios, os Estados adotaram a mesma estrutura, por meio das secretarias. Assim, a de Agricultura foi criada em 1897, mantendo a mesma estrutura até 1927, quando foi dividida em duas: Agricultura, Indústria e Comércio e Viação e Obras Públicas.
A sede foi concebida por Ramos de Azevedo, um dos mais importantes arquitetos paulistas. Seu projeto, no Centro de São Paulo, próximo do Páteo do Colégio, seria o centro das decisões do Estado, como a de investir na policultura, diversificando os plantios além do café e da cana. Iniciativas como essa foram impulsionadas na gestão do piracicabano Carlos Botelho, a partir de 1907. Na época, os gestores não eram identificados como governadores, mas como presidentes do Estado.
A exposição segue até 27 de novembro, e terá, ainda, o lançamento de um catálogo. A parceria é resultado da proposta de difusão, ponto em comum do Centro de Memória e do Espaço Engep. "São acervos vistos, muitas vezes, de forma pontual, e o Centro de Memória tem a intenção de difundir para o interior. Por outro lado, o Espaço Engep acolhe a mostra, trazendo esse conhecimento a Limeira e região".
O Espaço Engep fica no Largo da Boa Morte, 118, no Centro. A visitação é de segunda a sexta, das 9h às 18h e, aos sábados, das 9h às 13h.


Épocas eternizadas por anônimos (ou quase)

Dos trabalhos nos jardins à frente do Museu do Ipiranga, na capital, passando pela área da atual Faculdade de Agronomia Luiz de Queiroz, em Piracicaba, até o retrato da reserva da Cantareira, um belo jardim à época, as fotos selecionadas resgatam tanto obras que ficaram a cargo da secretaria quanto aquelas que apenas supervisionava.
Os fotógrafos que captaram os quadros da história são, na maioria, desconhecidos, mas há teorias para a origem, principalmente para os de Limeira. "Algumas fotos têm a informação no verso, como o nome ou legenda, mas era comum o Estado recrutar fotógrafos locais. Acreditamos que boa parte das fotos de Limeira foram produzidas pelo Estúdio Ceneviva, de Tomazzo Ceneviva", relatam os curadores. Reforça a hipótese o fato de algumas das fotografias já serem conhecidas, possivelmente pelo autor limeirense ter mantido uma cópia ou os negativos. (Daíza Lacerda)
sábado, 5 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Biblioteca, enfim, de portas e páginas abertas

Biblioteca, enfim, de portas e páginas abertas

Novo complexo é aberto ao público com conceito de espaço cultural além da leitura

Daíza Lacerda

Parecia até que o mundo ia começar em livros. Assim que as portas se abriram, rapidamente os corredores ganharam vida, num formigueiro curioso que não sabia o que buscar primeiro. Quadrinhos, clássicos, desconhecidos: os volumes saíam da inanição da estante direto para as mãozinhas inquietas das crianças. A biblioteca era, finalmente, apoderada pelo público.
Um dos pequenos arregalou os olhos quando soube que aqueles pequenos universos poderiam ser dele durante alguns dias. "Como assim, pode levar?". Simples assim, outros já haviam feito a escolha, como Lucas Gabriel Ferreira, de 12 anos, que agarrou o volume único de As Crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis. O livro não era extenso o bastante para ele: seria o 13º volume grosso que iria encarar. Para ele, "é ótimo praticar a leitura, para ficar mais esperto na escola e não tirar nota baixa".
A nova biblioteca de Limeira também traduz o anseio dos patronos João de Sousa Ferraz e Cecília Quadros, cujo apreço pela educação e cultura foi testemunhado pela neta Luciana Ferraz e sobrinha Maria Salete Ometto Quadros, respectivamente. O acervo pessoal do escritor, jornalista e psicólogo parecia um mundo mágico, nas palavras de Luciana. Já Cecília, que tinha "coletâneas de pulsar de coração", representava Limeira aonde ia, como atesta Maria Salete.
ESPERANÇAR
Ao agradecer a todos que colaboraram para a transformação da biblioteca num espaço diferente e inovador, a secretária de Cultura, Gláucia Bilatto, citou o educador Paulo Freire. Ele dizia que não se deve confundir a esperança do verbo esperançar com a do verbo esperar. "Não se deve esperar, mas buscar e reagir ao que não tem saída. Não esperar, esperançar", declarou, na entrega do projeto que pretende servir como um espaço cultural muito além da leitura.
O vereador José Farid Zaine relembrou o início do projeto da nova biblioteca, em período que foi secretário de Cultura. À época, o modelo das grandes redes de livrarias foi uma das inspirações para criar, em Limeira, um espaço para ampla circulação.
O prefeito Paulo Hadich destacou a atuação da biblioteca mesmo com o funcionamento em local provisório, em imóvel alugado na rua Senador Vergueiro, com espaço muito menor do que dispunha anteriormente, no prédio do Museu. Abordou a continuidade do projeto, iniciado antes de sua gestão. "Tínhamos a obrigação e dever de terminar e corrigir os erros. Compreendemos que o local poderia ter uma utilização maior, e abrigará também o Centro de Ciências, que está sendo finalizado e deve aumentar mais ainda o fluxo de pessoas". Outro ponto destacado pelo prefeito é a contribuição com suporte pedagógico para todas as escolas do município, públicas e particulares.
TIJOLINHO
Diversas pessoas ligadas à educação e literatura em Limeira prestigiaram a reabertura, como a escritora Zenaide Elias e Eudóxia Quitério, que faz questão de ser referenciada como professora primária. "Alfabetizei durante 30 anos, e sei avaliar o valor disso", disse ela, que condena veementemente a prática de passar de ano alunos analfabetos. "A boa alfabetização é o tijolinho da cultura de uma pessoa", salienta a educadora, que se mostrou contente com a nova biblioteca. "Dará um impulso e permitirá dedicação maior na finalidade da instrução", considera.
Após tantas mudanças de prédio, o acervo chega para ficar ao lado do Parque Cidade. Mas, mais do que nunca, a biblioteca está sujeita à mutação, que será provocada pelo público, como expõe a coordenadora Ligia Consuelo Araújo. "Agora, vamos receber a população, acolher as demandas e continuar o projeto da biblioteca viva, agregando outras parcerias para uma biblioteca atuante. É um equipamento cultural, um espaço de acolhimento. Queremos que as pessoas venham usufruir, se apropriar, serem parceiras para aquilo que elas necessitam e querem". 
sexta-feira, 4 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

A nova casa das palavras em Limeira


Bibliotecas são reinauguradas hoje em mudança prevista há mais de cinco anos

Daíza Lacerda

As bibliotecas de Limeira reabrem hoje enterrando o conceito de instituição que "guarda" o conhecimento, procurada principalmente pela obrigação dos trabalhos escolares. Renascem com a ideia de biblioteca viva, que só existe a partir da interação do outro, seja leitor, ouvinte ou admirador, estimulados pelo que ela tem a oferecer.
A partir das 10h30 de hoje, esse público tem local definitivo para buscar ou se perder nas obras de sua escolha, no novo prédio das bibliotecas no Parque Cidade. Eles serão saudados pelos dizeres dos patronos João de Sousa Ferraz e Cecília Quadros, cujas palavras preenchem o alto de um dos lados do complexo.
"É um olhar diferente da biblioteca, e acreditamos que as pessoas vão gostar, o que é a nossa satisfação. Fizemos tudo pensando nelas, em como vão ver, se sentir", declara Ligia Consuelo Araújo, coordenadora da biblioteca. A expectativa é de quem está há 19 anos na biblioteca, acompanhando as mudanças e novas demandas, que devem ser atendidas no novo projeto.
No espaço mais amplo que já teve, a biblioteca receberá os públicos adulto, juvenil e infantil com novo mobiliário e acervo de 39 mil volumes. Se contabilizados os periódicos, são 43 mil itens. Também há espaço para a tecnologia, com computadores do programa Agenda Cidadã, e outros que devem chegar por meio do projeto do Comitê para a Democratização da Informática (CDI)específico para bibliotecas, da fundação Bill & Melinda Gates.
A partir de hoje, o visitante é livre para acessar as obras nas estantes. Mas em breve poderá folhear as obras com mais conforto, já que o mobiliário novo ainda não chegou, como poltronas e puffs. Ainda não está pronto o anfiteatro, que também depende da chegada dos móveis.
NOVA CASA
Na tarde de ontem, retoques na pintura e na comunicação visual eram feitos. Mas o acervo foi estabelecido no local no início deste ano, quando deixou prédio alugado na Rua Senador Vergueiro. A mudança começou em fevereiro e, no mês seguinte, os livros já estavam em casa nova, ainda que não totalmente organizados.
As estantes obedecem à ordem de catalogação, mas os romances, mais procurados, ficarão à frente. O Espaço Zumbi dos Palmares, com obras acerca dos negros, também está disponível, assim como os volumes em braile e audiolivros. Para os mais saudosistas, até mesmo os livros mais antigos ficarão à disposição.
No período em que a abertura foi parcial, para leitura de periódicos e pedidos de livros no balcão, circulavam cerca de 80 pessoas por dia. Já a demanda depois de aberto o acesso às prateleiras ainda é incerta. É a procura que determinará o horário de atendimento que, por enquanto, será de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. Horários alternativos devem ser estudados, conforme a demanda.
Com as portas abertas, o local já tem evento programado para a próxima semana. No dia 10, a biblioteca recebe, às 15h, o autor Edson Garcia, que escreveu dezenas de livros infanto-juvenis. Às 19h, será a vez da revelação Marcos Perez, ambos pelo programa Viagem Literária, com participação gratuita.
Entre o alívio e a ansiedade de devolver o público ao acervo, Ligia faz o convite. "A biblioteca convida a todos para que venham conhecer o novo espaço. Desde aqueles que já eram frequentadores até quem estiver de passagem no parque. Entrem, conheçam e utilizem os serviços. A biblioteca é pública, da comunidade. De todos".






terça-feira, 1 de setembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Conquistando pelo estômago

Limeira teve, no último final de semana, uma amostra rara do poder de ocupação do espaço público. Quem foi a qualquer um dos dias do Limeira Food Truck, na Praça Toledo Barros, pode conferir uma harmonia singular no coração de Limeira. Coisa que nunca vi, mas muito ouvi sobre os tempos antigos em que a praça era o ponto de encontro das famílias, dos jovens e das crianças.

Nos tempos modernos, sabemos que essa apropriação pública perdeu espaço para o tráfico e outras ameaças de crimes, que espantam a população do Centro e de muitas outras praças. Mas uma é exceção: a praça João Soares Pompeu, conhecida como Praça da Buzolin, em referência à avenida em que está localizada. O que se viu na Toledo Barros nada mais é do que um retrato em grandiosas proporções do que é regra na Buzolin há muito tempo: área pública tomada pelo público, também graças às opções de alimentação estabelecidas ali.

Limeira ainda não conseguiu dar vida às suas principais praças, exceto por eventos pontuais. E se a experiência do Food Truck não aguçar a gestão para o lazer e gastronomia no município, esses espaços vão mesmo continuar fadados ao deserto. E não me refiro apenas ao poder público, mas aos comerciantes, que precisam virar o jogo e atrair visitantes para a cidade, e não dá-los de bandeja para a região.

Limeira tem opções ótimas para um festival de lanches, de pastéis, de sorvetes, sucos, coxinhas, e tudo mais que esteve à disposição na praça no final de semana. Limeira tem músicos de altíssima qualidade, talentos ocultos, e tem entidades que precisam de recursos e estão dispostas a trabalhar e a oferecer coisas boas, o que é marca em eventos tradicionais. Se juntar a fome com a vontade de comer, é possível que a população tome conta da(s) praça(s) com muito mais frequência, e não só uma ou outra vez no ano. Quem sabe, de forma permanente.

O comércio de Limeira ainda é muito conservador. Falta visão e ousadia para conquistar o cliente, que está muito mais exigente. Em tempos de reinado da internet, só atendimento de primeira linha e alternativas muito interessantes tiram compradores do conforto de casa. Como o lazer e a comida, que atraem gente de todo lugar. Se bobear, a qualquer preço. Quem nunca ficou à deriva procurando locais diferentes para petiscar ou papear no domingo à tarde? Parque Cidade e Horto são ótimos para lazer. Mas, convenhamos, com atrativo gastronômico zero. São lugares que gritam por opções para encher os olhos e o estômago.

A única ressalva do Limeira Foodtruck é o lixo. Provavelmente o evento atraiu um público muito maior do que o esperado, e não sei se as lixeiras foram insuficientes ou faltou mesmo uma organização melhor para não deixar o lixo acumular. Havia muita coisa no chão, próxima das lixeiras, mas não notei excesso de restos ou embalagens jogadas nas áreas de passagem, o que insinua boa-fé. Nos gramados, não vi um papel. Só muita gente sentada e relaxada ao lado das flores, curtindo o show de jazz, com a comida de sua preferência. A única queixa da maioria dos que conversei foi de não poder ter experimentado tudo o que era oferecido. Estávamos em final de mês, e muitas das opções não eram exatamente baratas. Mesmo assim, lotou.

Ficou o gostinho de quero mais. E o desejo de que a apropriação do espaço público seja regra, não exceção.