terça-feira, 24 de novembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Afinal, que lazer os jovens querem?

O que me surpreende no "mapa do rolezinho" em Limeira não é que jovens também de outras cidades venham se aglomerar no entorno do Pátio Limeira Shopping nas sextas à noite. O que assusta é considerarem isso opção de lazer. Publicado na edição de sexta-feira da Gazeta, o levantamento foi feito pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), e apresentado aos representantes da rede socioassistencial do Município.
A reclamação é sempre a mesma: faltam opções. Mas a questão é: o que é considerado opção por eles? Eu também já reclamei muito que Limeira não tinha o que fazer. Hoje, porém, isso seria meia verdade. Uma coisa é não ter, e outra é não ter o que nos interessa. Não é possível que essa faixa dos 14 aos 17 seja tão difícil de agradar.
O histórico dos frequentadores do ‘point’ do shopping não os favorece. As garrafas de bebidas largadas nas ruas até o dia seguinte são prova de que, para essa garotada, lazer é farra. É fácil reclamar que não há opções. Mas na hora de agir civilizadamente, cadê? Se não faz a sua parte, quer cobrar como? Se vai cobrar, que não seja na ignorância, mas com argumentos e razão. Saia do ‘point’, vá para as conferências da juventude.
Lógico que não há mal nenhum em eleger uma via pública para se encontrar com os amigos, papear. Mas, quem passa por ali sabe que o ar é mais intimidador do que qualquer outra coisa. O direito de ir e vir é de todos. De largar lixo e fazer gritaria em frente da residência e comércio alheios, de ninguém. Quanto ao shopping, embora seja um espaço aberto ao público, trata-se de um empreendimento privado e com um fim bem específico: vender. Por esta ótica, considero natural a tentativa de coibir a vadiagem. Veja bem: natural. Não quer dizer que seja justa. Nem todo jovem vai ali para causar anarquia. Seria injusto generalizar.
Faltam opções ou criatividade da parte desses jovens para usar melhor o tempo deles mesmos? Locais como Parque Cidade e Teatro Vitória têm agenda para escolher o que fazer, inclusive gratuita. Barzinhos também não faltam, para variados gostos e bolsos, é só se dispor a procurar. E com ambientes muito mais agradáveis. Mas é mais fácil socar a cerveja na garrafa de guaraná e ir sentar lá na calçada para reclamar que não tem o que fazer. Só eles mesmos para verem graça nisso.
Falando em graça da coisa, alguém me explica qual é a dos ‘points’ em postos de gasolina. Ah, é só para o "esquenta"? Que seja. Para mim, que tenho fugido dos postos e seus preços cada dia mais assustadores, é de muito mau gosto.
Se não é falta de ideias do que fazer, o desencontro das faixas etárias talvez explique. A pesquisa entrevistou pessoas de 10 a 21 anos. Obviamente, o tal ‘point’ não é ambiente para crianças daquela idade. Cadê os pais nessa hora, que adoram colocar o dedo nos narizes de gestores cobrando as coisas? Ainda tem muito casal com crianças achando que educação é obrigação do Estado. Não é. O Estado deve, sim, fornecer ferramentas. A direção do caminho, pelo menos na infância, é dos pais. Não é o Conselho Tutelar que tem que buscar. A responsabilidade é dos pais.
Já os de 21... Já eram para ter criado vergonha na cara para caçar algo produtivo.
Como dizem hoje, é muito mi-mi-mi. Como diria a minha mãe, mamar na vaca eles não querem.

Publicado na Gazeta de Limeira.
terça-feira, 17 de novembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

Enxergar à frente

Limeira não foi salva pelo gongo na questão da água. Foi salva pela visão. Se os limeirenses podem se considerar privilegiados no quesito abastecimento, é por consequência, e não por sorte. É o que mostra o histórico da realidade de Limeira há meio século, na pior seca antes da crise hídrica de 2014.
Cavar o histórico do SAAE na ocasião dos 50 anos da autarquia e as condições da implantação de captação e tratamento de água na cidade trouxe à tona uma Limeira que a nova geração desconhece. Aquela que se mobilizava em prol do coletivo, não só no discurso, mas nas ações. Mais do que isso, o resgate publicado na edição do último domingo na Gazeta retrata um modus operandi urgente agora, para o nosso tempo. O tempo das obras que se arrastam na burocracia. Precisamos para ontem de pessoas que pensem e executem seriamente pensando também no amanhã - e depois, e depois...
Estamos muito ocupados tentando resolver os problemas atuais. Mas os nossos antepassados também estavam, sem deixar de prover para o futuro. É possível que, na era da informação, perdemos a eficiência? Sobram discursos, faltam atos.
O dom de enxergar muito além do seu tempo deveria ser premissa de todo gestor, no âmbito público ou não. Se hoje o que vemos são tentativas, às vezes desesperadas, de remediar problemas novos e complexos, o que será das próximas gerações com o desconhecido (ou nem tanto) que há por vir?
Não é preciso ir longe: a sustentabilidade do nosso modo de vida atual é o desafio da vez, muito mais do que há meio século. Porque essas mudanças não foram consideradas lá atrás. Bastava um "e se...".
Mais de 500 anos deveria ser tempo suficiente para aprender a planejar, não? Não para quem tem a cultura do atraso, com toda mudança (política, social) chegando muito tarde desde a época do império. É como se o Brasil não tivesse aprendido nada com a industrialização, a urbanização, e todos os processos que provocaram uma metamorfose na cultura e modo de vida. Sabemos para onde vamos. Só que ignoramos. Será o futuro que Deus dará ou alguém proverá?
O abastecimento de água e tratamento de esgoto de Limeira são, felizmente, uma das muitas exceções em meio a inúmeras negligências do Estado e País afora. É inconcebível que em pleno 2015 ainda haja lugar sem saneamento básico. Básico! Mas essas carências ainda parecem "normais" no Brasil. Também é inadmissível termos de lidar com o desastre humano e ambiental como o de Minas Gerais. Estarmos sujeitos a consequências daqueles que não fizeram a lição de casa básica de prever e, principalmente, se precaver contra tragédias.
Claro que Limeira ainda sofre com muitas outras demandas comuns à falta de planejamento, a exemplo da mobilidade. A política é outra nos nossos dias, tanto quanto a população. Ainda é grande a passividade diante de problemas urgentes. Muitas cidades brasileiras mostram que foi mais rápido voltar a chover do que viabilizar soluções eficazes.
As cidades sempre serão desafios ambulantes, com dez demandas nascendo quando uma for sanada. Mas o fato de não dar conta não é desculpa. Quem dá a cara a tapa, tem que fazer acontecer. Não adianta olhar para o umbigo. Tem que olhar à frente. Muito à frente.

Publicado na Gazeta de Limeira.
segunda-feira, 16 de novembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

O saneamento de Limeira desde a 1ª gota

SAAE completa 50 anos de fundação com comemorações e resgate da trajetória

Daíza Lacerda

Se para a população paulista foi difícil passar pela crise hídrica no ano passado, talvez a geração atual não tenha ideia de como foi a seca de 1964. Naquele ano, o abastecimento de Limeira era pela represa de Cascalho, que virou pó. Histórica até então, aquela seca marcou o início da mobilização para o abastecimento e saneamento em Limeira, com a criação do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), que completa 50 anos nesta segunda-feira. Na celebração de meio século da autarquia, personagens que participaram da evolução da estrutura hídrica resgatam suas histórias.
Uma publicação de 1967 da prefeitura prestava contas da saga da construção da Estação de Tratamento de Água (ETA), inaugurada naquele ano. O material descreve que a represa de Cascalho foi construída entre 1911 e 1912, como única fonte do município, então com cerca de 60 mil habitantes.
Em março de 64, foi decretado estado de calamidade pública pelo então prefeito Paulo D'Andréa. A distribuição de água era feita com caminhões-pipa, e os moradores recorriam à Bica do Bicão, que ficava no cruzamento da Dr. Trajano com a Lavapés. Formavam fila para pegar água, cada um levando seu balde ou lata. A fonte era localizada numa região rica em nascentes, como a do córrego Lavapés, que corre sob o Mercado Modelo.
Antes da seca, apesar da água garantida, não havia tratamento. Quando chovia, da torneira saía barro, inclusive com minhocas.
Essas são algumas das memórias de Ernesto Luiz Felizi, de 74 anos, que trabalhou no Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) durante 30 anos, a partir de 1975, acompanhando a evolução dos serviços no município. E foi na seca que começou a nascer a estrutura que livraria Limeira de voltar a passar sede, exatos 50 anos depois.
A PROFECIA DO MAJOR
Quando Limeira dependia de Cascalho, a distribuição era de um reservatório que ainda existe, no cruzamento da avenida Fabrício Vampré e Cônego Manoel Alves. Mas o primeiro serviço foi em 1908, em captação de nascente do Morro Azul. Na mesma época, um reservatório foi construído próximo do atual Nosso Clube, que iniciava as obras naquele local. Era a Caixa do Inocêncio, no entorno de uma nascente que abastecia chafarizes nas principais praças de Limeira.
Não se tem notícia de quem era o Inocêncio que batizava a caixa em 1908, mas quando a represa de Cascalho começa a atender a crescente demanda em 1912, teve praticamente decretada a data de validade por quem a financiou: o então prefeito major José Levy Sobrinho. Pagou a represa com um empréstimo de 700 contos de réis, e previa que o serviço atenderia Limeira por 50 anos.
A previsão certeira do major levou à mobilização para garantir não só água, mas água tratada nos anos 60. E com este objetivo o SAAE foi criado por decreto em 16 de novembro de 1965, inaugurando a Estação de Tratamento de Água (ETA) dois anos depois, às margens da Anhanguera.
NA LÁBIA
Sem a burocracia atual, projeto e construção correram a toque de caixa. A obra virou referência, mas nasceu de maneira artesanal e comunitária, com a captação 16 quilômetros distante da área urbana. Sem GPS ou satélites, a linha da tubulação até a ETA foi definida passo a passo e na autorização verbal. "Conta-se que andavam e perguntavam para o proprietário se a tubulação poderia passar ali. Quando autorizado, soltavam fogos para avisar daquele ponto. Alguns donos até se animavam, achando que poderiam usar água direto daquele encanamento", conta Felizi. A população ajudou na abertura das valas, feita "no braço", sem máquinas. 
Ele também lembra que a primeira opção era trazer água do Rio Piracicaba, pela Estrada da Balsa. Mas optou-se pelo Rio Jaguari, instalando a ETA em território que ainda não era de Limeira, mas de Cosmópolis.
As providências ocorreram no auge da produção cítrica e industrial do município. Em segundo plano hoje, os poços artesianos é que mantiveram as atividades industriais, sendo que a antiga União, por exemplo, tinha 55 deles.
Com credores em todas as esferas, inclusive internacional, as obras no Jaguari custaram cinco milhões de cruzeiros novos, para tratar até 20 milhões de litros/dia na primeira etapa, mas com cálculos para o dobro disso, considerando população de 160 mil pessoas. Atualmente, o tratamento diário fica entre 50 milhões e 57 milhões de litros/dia.

Foto: Arquivo SAAE
Captação no Rio Jaguari: avanço da tubulação foi
feita com autorização verbal de proprietários de terras


Foto: JB Anthero/Gazeta de Limeira
Ernesto Felizi: população fazia fila
para buscar água na "Bica do Bicão"



Jaguari refém da cheia

Assolado pela estiagem que derrubou a qualidade que já não era referência em 2014, o Jaguari era tido, em 1965, como um dos mais limpos da região. E foi em suas margens junto à do vizinho Ribeirão Pinhal que seria erguida a captação. Porém, à mercê dos ânimos climáticos, a solução da seca foi refém das cheias de 1972, quando a captação ficou submersa e Jaguari e Pinhal viraram um só. Até hoje uma construção no local demarca a altura que a água chegou. (Daíza Lacerda)

Foto: Arquivo SAAE
Planejada na escassez de água, captação no
Jaguari foi inundada em fevereiro de 1970







 
Os engenheiros Pedro e Lillian no caminho da água



Casal iniciou a gestão da autarquia, com projeto e execução em tempo recorde

Daíza Lacerda

Pedro Moraes Siqueira e Lillian Theresa Senra Siqueira eram um casal de engenheiros químicos que vivia na área rural de Limeira até meados da década de 60. Com os filhos crescendo, ele veio até a cidade procurar o colega de cursinho Paulo D'Andréa, então prefeito. Foi buscar serviço e recebeu um desafio: o do abastecimento em Limeira, como novo diretor do departamento de água e esgoto.
Em 1964, todas as nascentes estavam secas, além da represa de Cascalho. A saída foi captar do Ribeirão Pinhal, manancial que se tornaria estratégico 50 anos depois. Mas, àquela altura, importante mesmo era o Jaguari, escolhido para a captação que abasteceria a cidade, como lembra Lillian. "Quem poderia imaginar? Era o mais limpo da região, até a formação do Cantareira". Ainda que o Pinhal estivesse em segundo plano, não foi descartado, sendo a captação implantada na confluência dos dois mananciais.
Siqueira foi o primeiro gestor do SAAE, à época sob a denominação de diretor, e não presidente. Lillian atuou junto, tendo aprimoramentos na área durante um ano em Campinas antes do tratamento estrear em Limeira. Lá, já fazia análises da qualidade da água, e a ETA limeirense nasceu com um laboratório de bacteriologia, o que surpreendeu até o governador da época, Abreu Sodré.
Enquanto Siqueira falava em inúmeros encontros e reuniões para informar a população e entidades sobre a causa, Lillian criou uma cartilha dos manejos para os futuros profissionais da ETA. Como base para estudo, faria um teste para selecionar os funcionários, que atuariam desde a fase final das obras.
Sob a condução de ambos nos primerios anos, a referência era tanta que a engenheira dava treinamentos nas cidades vizinhas. Com parte do financiamento do projeto pela "Aliança para o Progresso", dos Estados Unidos, Siqueira faria cursos naquele país. Um engenheiro norte-americano acompanha a evolução do projeto, e também viabilizou a visita de Lillian a uma estação de tratamento em Washington, com o que havia de mais avançado.
DESBRAVANDO
"Atravessamos brejos, florestas, pomares. Não havia materiais, como máquinas para descarregar a tubulação. Era tudo tirado do caminhão", lembra, ressaltando a colaboração da população. De fato, a cessão da terra para a tubulação foi somente verbal. E a colaboração foi em todas as fases, da captação, da estação, e dos ramais para que a água chegasse até a cidade. Limeira era uma das pioneiras na qualidade do tratamento. Antes dela, apenas Campinas tinha estrutura parecida.
A parceira americana que contribuía no financiamento exigia que o serviço fosse autônomo, ou seja, que a verba fosse exclusivamente usada para a água e esgoto. "Com isso, conseguíamos pagar os funcionários e os produtos químicos. Ainda sobravam 30% para obras novas, como a implantação do esgoto". 
A atuação de Siqueira foi além. Ele foi procurado por Zeferino Vaz, fundador da Unicamp, para a implantação da faculdade de engenharia em Limeira. Além de diretor do ramo limeirense da Unicamp durante 7 anos, o engenheiro também foi vice-prefeito na gestão de Sebastião Fumagalli.
O casal voltaria à autarquia no final da década de 80, quando o desafio da vez era o esgoto. Debilitado por um câncer com o qual conviveu durante 8 anos, trabalhando, Siqueira queria a realização da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Tatu. Morreu em 1991, quando Lillian assumiu o seu lugar na presidência do SAAE.
A ETE era questão de honra não só para o casal como para Paulo D'Andréa, novamente prefeito. Mas o chefe do Executivo estava inseguro em inaugurar a ETE ainda incompleta, com a entrada do tratamento e mais 14 quilômetros de emissários. Mas, como Mário Covas tinha, à época, feito grandiosa festa para lançar 7 quilômetros, a inauguração não foi adiada e aconteceu em 1992.

Foto: JB Anthero/Gazeta de Limeira
Lillian Siqueira: mais do que braço direito do
marido, atuação direta na gestão do SAAE



A hora do esgoto

Resolvido o problema da água, o tratamento de esgoto desafiaria as gestões das próximas décadas, sendo que os dejetos eram despejados in natura no Ribeirão Tatu. Eram nada menos do que 40% da carga polunte que chegava até o Rio Piracicaba, como lembra Armando Cecato, que acompanhou o processo de construção da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Tatu desde quando iniciou no SAAE, em 1989.
Ele conta que a construção ocorreu entre 1989 e 1992, em parceria da autarquia, prefeitura e representantes de cerca de 20 indústrias. Os industriários seriam ressarcidos quando o serviço passou pela concessão. Antes da ETE, havia estações de tratamento em teste, como no Nova Limeira e Graminha, além de uma tentativa eletrolítica, que se mostrou ineficaz.
Mas a intenção de tratar seria ainda mais antiga, como cita Ernesto Luiz Felizi. "A rua dos Filtros serviria para filtrar o esgoto na década de 30. Limeira teve administradores com visão no saneamento", cita, em referência à rua que fica entre a avenida Campinas e a ferrovia, na Marginal Tatu.
Até o início dos anos 80, a maioria da cidade não tinha rede de esgoto, em época que o SAAE assumiu também as redes de drenagem, que eram mantidas pela prefeitura. Além do esgoto, a estrutura antienchente passava a ser responsabilidade da autarquia, numa época em que não havia Defesa Civil.
Herdou, portanto, o problema da região do Mercado Modelo, já notório. "A pior enchente aconteceu em dezembro de 1961, no mesmo dia em que um circo pegou fogo em Niterói, no Rio de Janeiro. Naquele dia, as portas do açougue estufaram, com água quase no teto", lembra Felizi.
O problema se repetia nas décadas a partir de 1990, na memória de Cecato. Entre as mais recentes, a pior enchente aconteceu em 2007 no complexo comercial construído numa baixada bem em cima do córrego Lavapés.
Em 2008, no terreno que tinha uma base da Guarda que foi destruída pela água foi construída uma pequena bacia de detenção para amenizar a situação, ao lado do Mercadão. Mas a expectativa é que a solução seja definitiva com a construção do piscinão sob a pista de atletismo Tiro de Guerra.
Já outras áreas dependem de investimento muito alto para o fim das enchentes. Somente a partir de 1997 é que foram estabelecidas regras técnicas para loteadores, para redes de drenagem adequadas. (Daíza Lacerda)

Foto: JB Anthero/Gazeta de Limeira
Armando Cecato: depois da implantação
do esgoto, desafio da drenagem








"O SAAE resolveu o problema da água em Limeira"

Em meio século de existência da autarquia, balanço do atual presidente é positivo

Daíza Lacerda

Se Limeira passou praticamente imune à crise hídrica de 2014, é justamente devido às providências tomadas há 50 anos. E a garantia de água é motivo suficiente para comemorar, como avalia o presidente do SAAE, Osmar da Silva Júnior. "Se todo esse trabalho não tivesse sido feito em 1965, nada disso seria colhido. A concessão presta um bom serviço, mas havia uma base 30 anos antes. O SAAE resolveu o problema da água em Limeira", salienta.
A situação atual é de equilíbrio financeiro, mas com limitações para investimentos, em panorama pessimista se considerada a dependência de recursos do governo federal e estadual. "Cuidamos dos custos da administração, RH, precatórios, manutenção e gastos jurídicos. Somos eficientes na manutenção do que existe, mas sobra pouco para investir. Não recebemos repasses de taxas", explica Osmar. A dificuldade está diretamente ligada ao principal desafio dos próximos anos, de acabar com os principais pontos de enchente da cidade.
Um Plano Municipal de Redução de Riscos (PMRR) listou esses pontos, e cada um teve um projeto um pouco mais aprofundado para conhecimento das implicações e investimentos, que chegariam a R$ 19 milhões, considerando a solução de todos.
O consenso é que não há cidade totalmente preparada para chuvas torrenciais, sendo que a força da natureza pode frustrar até mesmo os maiores dimensionamentos projetados por engenheiros, como o piscinão.
PISCINÃO: DIVISOR DE ÁGUAS
Se a estação de água foi referência na década de 60, o piscinão promete ser outro divisor de águas no histórico do SAAE, para acabar com as enchentes na baixada do Centro. Mas, até que a pá tirasse o primeiro punhado no gramado da pista de atletismo ao lado do Tiro de Guerra, o clima era de tensão. Afinal, o projeto se arrastava há anos. "A ideia era antiga, mas precisávamos de uma área pública para isso", lembra Armando Cecato.
Ele reitera que não há projeto semelhante no interior. Obra de tal  porte existe apenas em São Paulo, de onde foram tirar a ideia. Visitaram o piscinão sob a Praça Charles Miller, em frente ao Estádio do Pacaembu, que tem estrutura muito maior.
Com orçamento de R$ 25 milhões, a obra passa da metade do prazo de dois anos, e avança com dificuldade devido aos atrasos de repasses do governo federal. Que é outro desafio da autarquia. "Estamos focados em finalizar o piscinão, que é uma obra que muitos duvidaram que sairia do papel. Com ele, o SAAE continua fazendo história".

Foto: JB Anthero
Osmar: desafio atual é de acabar com
12 principais pontos de enchentes


Concessão polêmica

O SAAE foi responsável pelos serviços de água e esgoto até 1995, quando o prefeito Jurandyr Paixão fez a concessão, polêmica à época. No edital internacional, seria vencedora a empresa que oferecesse a menor taxa dos serviços. A concessão foi feita a uma detentora francesa.
Armando Cecato lembra que a autarquia mantinha os serviços, mas o índice de perdas d'água era alto, em torno de 40%, e não havia condições para investir na redução. Essa e outras questões estruturais seriam responsabilidade da empresa concessionária, a a Odebrecht Ambiental, com contrato vigente até 2039.
Ao SAAE foi atribuída a fiscalização dos serviços da concessionária, além da manutenção da rede pluvial. Sem a receita das tarifas, o orçamento dependia da prefeitura até 2001, quando um aditamento no contrato estabeleceu que a autarquia teria 9,5% da receita líquida da concessionária. Neste ano, o orçamento é de R$ 9 milhões, com previsão de incremento de meio milhão para 2016. (Daíza Lacerda)


"Não havia nem cadeiras"

Hoje os departamentos do SAAE estão concentrados no Paço Municipal, no Edifício Prada. Mas, há meio século, a autarquia não possuía nem uma cadeira. É o que lembra a primeira funcionária registrada, Heleni de Oliveira, de 69 anos.
Apesar de muitos estranharem, para ela é comum tomar água direto da rede de distribuição, sem filtro. É a confiança de quem também já viu barro e minhocas saindo da torneira.
Ela, que assessorava o primeiro presidente da autarquia, Pedro Moraes Siqueira, lembra que tarefas corriqueiras hoje não eram tão fácil antes. "Para fazer ligações, primeiro tinha que passar pela telefonista, que completava a chamada. Muitas vezes começávamos de manhã para conseguir falar só à tarde".
Mesmo os controles das contas de água eram artesanais. Os primeiros, feitos em máquinas de escrever. Com o tempo é que a cobrança foi aperfeiçoada, com emissão de recibos no computador. "A população era bem menor, mas mesmo assim era muito serviço. O dr. Pedro pedia para os funcionários trabalharem à noite, e nunca nenhum recusou".
No início, os serviços também tinham dinâmica diferente, sem licitação para a contratação. "Quando dava algum problema em alguma bomba no Jaguari, já havia um mecânico para prestar o serviço de manutenção. Os pedidos eram feitos via memorando, com o recibo do pagamento anexado", diz ela, que tinha a instituição como uma família. "O SAAE sempre foi modelo". (Daíza Lacerda)


Foto: JB Anthero/Gazeta de Limeira
Heleni foi a primeira funcionária registrada do
SAAE, em época sem regalias tecnológicas

Publicado na Gazeta de Limeira.
terça-feira, 10 de novembro de 2015 | By: Daíza de Carvalho

O rock não morreu - e nem a esperança contra o câncer

Antes da abertura das vendas ao público em geral, estavam esgotados os ingressos premium para o show da banda inglesa de heavy metal Iron Maiden, em março de 2016, em São Paulo. Se o Brasil foi destino certo de todas as turnês da última década, a corrida pela área mais privilegiada e cara do show no Allianz Parque talvez se explique pelo susto que a banda e fãs passaram neste ano, quando o vocalista Bruce Dickinson foi diagnosticado com um câncer na língua. A notícia desesperou os fãs do rock, já que restam pouquíssimas bandas da velha guarda em atividade, ainda mais em turnês internacionais. A própria vítima, porém, encarou a fase da forma mais serena possível, algo que deve ser inimaginavelmente difícil para um portador de câncer. Conduta inspiradora, mesmo para os que não gostam do gênero.
Numa entrevista ao Fantástico que foi ao ar em setembro, Bruce, que ainda é piloto de avião e esgrimista, justificou que surtar não o faria sentir-se melhor. A calma vem da experiência nos ares. "Você está num avião e as turbinas pegam fogo. O que você faz? Como reage? Você tenta algo e vê se funciona. Se não, tenta outro plano. Você pode dizer: ‘ai, meu Deus, eu vou morrer’, ou pode dizer: ‘Talvez eu morra, mas talvez não’. Eu sou assim", disse, na entrevista. Dois nódulos, um deles do tamanho de uma bola de golfe, foram descobertos num exame de rotina no final de 2014, e o tratamento seguiu no semestre seguinte, sob sigilo.
A história é exemplo do quanto é crucial o diagnóstico em estágio inicial, que é o grande alerta dos meses de conscientização contra o câncer. Se levada a sério, e cultura dos exames periódicos poderia prover mais finais felizes, como o dos fãs do Iron. No Brasil, infelizmente impera o hábito de esperar a dor para remediá-la, sem a cultura da prevenção. É claro que os nossos sistemas de saúde, (público e particular), não colaboram. Mas não custa checar como as coisas estão quando, aparentemente, não há problemas. Afinal, muitas doenças são silenciosas.
Na era em que temos inúmeras tecnologias ao nosso favor para viver melhor, deixamos de fazer o básico para a boa saúde. Não falo só de exames preventivos, mas da fuga de um estilo de vida que consuma todas as nossas forças e ânimo. É como o médico oncologista Drauzio Varella disse em sua passagem em Limeira: não adianta abrir mão do exercício físico ou descanso pela família, se um ataque cardíaco pode tirar você dela.
Se o câncer devasta vítimas e familiares, a luta faz sobreviventes que se tornam semeadores de esperança e informação. Mas é preciso se esforçar. Principalmente os homens, que em pleno 2015 ainda mantêm reservas para fazer o exame preventivo do câncer de próstata, entre outros. Alguns veículos publicaram que a origem do câncer de Bruce Dickinson teria sido o HPV, contraído via sexo oral, e que o astro teria ressaltado que muitos fazem piada, mas o assunto é muito sério. Saúde custa muito mais do que orgulho.
A longevidade não vem sem um preço ou esforço. Situações à parte são os rockstars Ozzy Osbourne e Keith Richards, que merecem estudo de casos por estarem vivos após tantas décadas de dependência química. Fica o desafio para a ciência... Mas, no mundo dos anônimos, não há efeitos especiais: a prevenção ainda é o segredo para o show continuar.

Publicado na Gazeta de Limeira.