COLUNA RELEITURA - 17/05/2016
Um Underwood para chamar de nosso
Daíza Lacerda
Terminando
de assistir a quarta temporada de House of Cards, foi inevitável me
perguntar o quanto a arte imita a vida. Na famosa série do serviço
Netflix, o protagonista é o brilhante Kevin Spacey na pele de Frank
Underwood, o congressista inescrupuloso que chega à presidência dos
Estados Unidos. Levando-se em consideração que, após inúmeras manobras, o
personagem ficcional (?) alcança o poder e tenta manter-se nele de
forma ilegítima, temos agora, em Michel Temer, um Underwood para chamar
de nosso. Sem saber o quanto a busca cega pelo poder ainda vai nos
custar.
Eu costumava me descrever como alguém que "não é de direita e
nem de esquerda, mas da contramão do lugar-comum". Sem ter nenhum
partido ou ideologia política que me seduzisse, assim permaneço. E a
situação do impeachment nos moldes que é executado, uma medida extrema
em tempos de falsa democracia, nada mais é do que uma vertente
diferenciada da costumeira falta de honra que prevalece com tudo o que é
público.
Não sou a favor da política de Dilma e reconheço que o seu
governo acabou faz tempo, quando ela passou a se preocupar mais em
defender o cargo do que gerir o País. Também não me inspira sequer um
fio de otimismo alguém que chega ao poder como Temer chegou. Embora
eleito indiretamente, mas eleito, mesmo para os patamares políticos a
sua traição à presidente foi vergonhosa. Mais um exemplo do qual esta
Nação não precisa. Tarde, talvez comecemos a ter mais atenção aos
candidatos a este cargo, situação que os espectadores da série
certamente já analisam com mais interesse.
O problema que nos mantém
patinando na lama não é o afastamento de Dilma, mas a permanência dos
tantos que têm tanto a explicar, a exemplo da boa parte do time
ministerial de Temer, além do próprio. Prova que a "justiça" é feita
quando interessa, e não sempre que é necessária. Não dá pra ser
otimista.
Uma análise pertinente é a do jornalista Denis Russo
Burgierman, da revista Superinteressante (http://abr.ai/23NRVMN). Ele
lembra que, em meio às asneiras, o principal não foi discutido na
votação dos deputados: os indícios sérios dos crimes de Dilma. E que o
País está cheio de ciclistas fiscais como ela, inclusive Temer que, "nos
curtos períodos em que substituiu a presidente em sua ausência, pedalou
três vezes mais que ela", e o próprio relator do processo de
impeachment no Senado, Antonio Anastasia, enquanto governador. Outro
adepto citado pelo jornalista é o governador paulista Geraldo Alckmin,
cujas pedaladas ultrapassariam R$ 300 milhões, "bem menos que os bilhões
de Dilma, mas crime igual". E atenta: "Se o Congresso quer seriamente
punir Dilma, é importante que se afirme com clareza a disposição de
punir de maneira equivalente todos os ciclistas fiscais, independente de
partido ou de taxa de popularidade".
Finalizo lamentando e
concordando com o roteiro da vida real: "Um processo ilegítimo para
punir um mandatário pelos seus processos ilegítimos não é um passo na
direção de um país melhor. Não contribui em nada para deixar nossas
instituições mais sólidas, justas e democráticas".
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