sexta-feira, 8 de abril de 2011 | By: Daíza de Carvalho

Mortes no Rio retomam discussão da segurança em escolas

Daíza Lacerda

O caso na escola do Rio de Janeiro trouxe à tona a questão da segurança das escolas. Gestores e profissionais procurados pela Gazeta, além de lamenetar a tragédia, reconheceram a dificuldade e até impossibilidade de um ambiente 100% seguro, além das instituições educacionais.

A apreensão dos pais foi o primeiro reflexo diante do acontecimento inédito no Brasil, comparado ao episódio em Columbine, em 1999. "É claro que nos preocupamos, hoje em dia não dá para confiar em nada. Só mesmo um psicopata para fazer algo do tipo. O pior é quando os próprios alunos se agridem e os pais não ficam sabendo. Do portão pra dentro, a responsabilidade é da escola", declarou a autônoma Maria José Soares, 33, que buscava o filho de 11 anos em uma escola na tarde de ontem.
A vendedora Rosângela Aparecida Moreira, 28, também teme. "As escolas deviam ser mais seguras, exigir identificação no acesso, não deixar qualquer um entrar sem revista ou segurança. Tememos que possam ocorrer outros casos", declara.
Funcionários de escolas também sentem-se ameaçados, como a inspetora d euma escola estadual que preferiu não se identificar. "Às vezes temos represálias fazendo o nosso próprio trabalho", disse, citando que aluno uniformizado nem sempre é sinônimo de segurança.

CUIDADOS
Em algumas escolas estaduais e municipais percorridas pela reportagem o visitante é recebido com grades e travas, após ser recepcionado na secretaria. Os alarmes são a "defesa" mais comumente usada, já que as intituições dependem de liberação de verbas para incrementar a segurança com câmeras, por exemplo.
"Se o pai precisa falar com o filho, fica esperando e o aluno vem até ele. Nos horários de entrada e saída, um inspetor e alguém da direção fica em cada portão", explicou Enéas Raimundo, vice-diretor da EE Brasil. "Reduzimos problemas de 10 anos para cá com disciplina, rigidez e muito diálogo, também com os pais. Foi com muita colaboração. Se a segurança já era algo que necessitava de atenção, agora, mais ainda", acrescenta.
Em outra escola estadual, uma educadora que também preferiu não se identificar, reconheceu que muitas vezes não se conhece o pai do aluno, mas deixa entrar. "Tentamos controlar, mas se alguém chega mal-intencionado, como vamos impedir? A escola é pública". Outro problema apontado e a falta de funcionários suficientes para garantir maior segurança. "Já esperamos questionamentos dos pais nas próximas reuniões", observou.
Na Emeief Maria Aparecida Degaspare, a diretora Judite Helena Caram explica o esquema de entrada na escola. Interfone, câmera, e atendimento em balcão com outro portão trancado até o páteo são as medidas de segurança, além de aviso prévio e apresentação de crachá e autorização no caso da visita de pais ou profissionais de manutenção. "Mas o que podemos fazer se a pessoa apresenta uma credencial falsa? A responsabilidade do portão para dentro é nossa, mas fazemos o que podemos", diz a vice-diretora Cassiana Goriel de Moraes Martins.
O próprio secretário municipal da Educação, Antonio Montesano Neto, reconhece que é difícil se prevenir contra uma ação como a ocorrida ontem. "Como brasileiro, nunca passaria pela minha cabeça algo do tipo. Não sabemos como os jovens e adolescentes vão receber isso. Será um problema sério com o impacto da tragédia", disse ele, que prevê reunir os educadores para tratar do assunto. "Pais e alunos vão se perguntar em como ir para a escola amanhã [hoje], mas não há quem responsabilizar, a não ser a própria pessoa que provocou a tragédia", opinou. Segundo o secretário, as unidades contam com portões eletrônicos e a Prefeitura estuda a implantação de câmera de segurança.

ABRIR OU TRANCAR?
As brechas na segurança colocam em cheque a defesa de gestores da abertura dos portões das escolas para a comunidade. Em Limeira, 16 escolas (10 estaduais e seis municipais) estão nesta situação aos finais de semana, participantes do programa Escola da Família.
A informação é da dirigente regional de ensino, Sílvia Regina Spineli Koshikumo, que defende que é preciso analisar o contexto da escola na sociedade. "A escola está inserida na sociedade, que é violenta. Nisso, a escola ainda é um dos ambientes mais protegidos. Apesar disso, orientamos ações como o uso de uniformes, contato com os pais e a não dispensa de alunos antes do horário", especifica.
Segundo ela, os funcionários são orientados a ficar atentos com a identificação de estranhos e autorizações . "Não temos como evitar tudo, embora quiséssemos", lamenta.
Nas possibilidades de prevenção, ela cita que a legislação não permite cercas elétricas nas escolas, que pode proprocionar riscos aos próprios alunos. No âmbito social, de atenção ao aluno, ela disse que já foi falado no governo da implantação de profissionais de psicologia e assitência social em atendimento móvel, pelomenos em cada diretoria regional. "Fazemos o possível para formar o jovem, com palestras, por exemplo. A sociedade é sofrida de um modo geral e por trás de atitudes como a que vimos há famílias desestruturadas e uma história de vida de privação e dificuldades", reflete.

"Professores precisam ter preparo para conversar com alunos"

Para a psicoterapeuta Solange Dantas o momento ainda é de suposições, mas as consequências do caso no Rio de Janeiro pode dar pistas do que teria levado o acusado a se dispor a matar tanta gente. "A maioria das vítimas é menina, o que pode ser algo significativo, como algum trauma ou decepção. O que se diz é que estava focado em religião e terrorismo, ideais que podem ter resultado no ataque com a ingestão de alguma droga", diz.
Reação a bullying também é cogitada, o que aumenta a preocupação de o ato se torne frequente. "Acaba servindo como um modelo negativo. Por isso é necessária a atenção de autoridades de todo o País com a saúde mental. Muitos doentes não têm tratamento adequado. Dão remédios em casos de internação, em casos que não se consegue coibir tamanha violência", analisa.
Ela pontua a violência como uma doença em si, que pode ser remediada com educação. "Se nada for feito, é só o começo de um cenário deprimente e perigoso", diz ela, citando os casos de violência na escola, como agressão de alunos a professores, que deixam de ter o tratamento e resolução que merecem.
"Permanece o cenário de que quem comete essas agressões não têm limite, podem tudo e nada acontece. É a impunidade", ressalta, apontando o Estado como omisso na questão, diante da falata de vagas em leitos psiquiátricos. "São pessoas que ficam ao Deus-dará e em surtos cometem crimes como o assassinato dos próprios pais, como já foi registrado na cidade".
Agora, ela defende que os professores precisam ter preparo para conversar com os alunos para não ampliar o cenário de terror. "Deve-se evitar prolongar o assunto, mas os professores devem estar mais atentos à violência e ao bullying. É educação, não há mágica para deixar de ser vítima futuramente. É preciso entender que o ser humano é corpo e mente, e que as consequências podem recair sobre toda a sociedade".

PM tem quatro viaturas na ronda e GM atende chamados de escolas
                    
O chefe interino de Comunicação Social da Polícia Militar de Limeira, tenente Edson da Costa Pereira informou, em nota, que "em Limeira, na área da 5ª Cia e na área da 1ª Cia contamos com quatro viaturas de Ronda Escolar das 7h às 23h para ocorrências dessa natureza e também para visitações em escolas, em sua maioria Estaduais. Temos com essas quatro viaturas uma quantidade irrisória de ocorrências, se comparado ao Policiamento convencional".
Conforme a nota, em 2010 não foi registrada nenhuma ocorrência envolvendo arma de fogo em Limeira, apenas um caso de lesão corporal provocada por estilete em briga de menores, mas nada de origem parecida ao ocorrido no Rio. "Em 2009 uma equipe de Ronda Escolar prendeu numa Escola Municipal um jovem portando um revólver, mas sem provocar seu uso. Outras ocorrências são registradas na atualidade envolvendo escolas, sempre ligadas a brigas por motivos banais".
Secretário municipal de Segurança Pública, Siddhartha Carneiro Leão explicou que o objetivo original do Pelotão Escolar era o da permanência de guardas municipais no portão e interior de escolas, e não com viaturas. Mas, com a mudança das necessidades, hoje o Pelotão conta com três motos, uma viatura e uma van. "É diferente da atuação da Ronda Escolar da PM, que é de patrulhamento. São muitas escolas e não há como atingir todas. Atendemos diretores com problemas e que fazem a solicitação. Aí o Pelotão faz o planejamento para resolver a questão. Agimos conforme a necessidade. Não temos estrutura para tudo, mas não ficamos sem fazer nada", justifica.
A inspetora da Guarda Municipal e reponsável pelo Pelotão Escola, Rita de Cássia Florêncio diz que a equipe atende casos raros, como porte de arma branca. Mas o episódio serve de alerta para que os responsáveis das escolas cuidem da segurança, como nunca deixar portões abertos. Muitas vezes, o chamado vem de pais ou alunos, não necessariamente da direção. "Quando o problema é fora da escola, ficamos sabendo. Mas se acontece dentro e não somos comunicados, fica difícil ajudar a tentar a resolver", diz. (DL) 


Em nota, Apeoesp cita vulnerabilidade
das escolas e falta de funcionários


O Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), em nome da presidente Maria Izabel Azevedo Noronha, emitiu nota à imprensa ontem, lamentando a tragédia em nome de todo o magistério público paulista. "Embora nessa proporção o ocorrido seja singular, o fato mostra que existe uma situação de vulnerabilidade nas escolas públicas, nas quais são corriqueiros casos de violência, dentro das unidades e no seu entorno. No Estado de São Paulo, a vulnerabilidade decorre também da ausência de funcionários em número suficiente e da extinção de funções importantes, como a de porteiro e inspetores.
O sindicato defendeu que "cabe ao Estado desenvolver políticas que minimizem a violência nas escolas e garantam a segurança dos que nelas estudam e trabalham, sobretudo através do envolvimento da comunidade escolar na gestão democrática da educação, mas também assegurando a presença de policiamento comunitário no entorno das unidades escolares para combater crimes e delitos que terminam por afetar o seu cotidiano". (DL)


0 comentários:

Postar um comentário