terça-feira, 16 de fevereiro de 2016 | By: Daíza de Carvalho

O fim do começo na educação

Daíza Lacerda

"Estamos no fim do começo. Não no começo do fim". Foi citando Churchill que o filósofo e educador Mário Sérgio Cortella situou a condição da educação do Brasil, em entrevista publicada ontem no Estadão (bit.ly/20WaLoT). Em sua análise, estivemos em situação bem pior, com exclusão na educação básica e analfabetismo adulto que, ainda que permaneça "vergonhoso", saiu de patamares piores.
Para Cortella, o Brasil começou a sair da indigência na área da educação escolar nos últimos 30 anos. Reconhece que não é o bastante, mas indica um caminho possível. Pontua como problemas tudo aquilo que passará ao largo, daqui para frente, no período eleitoral, em que números serão uma espécie de realidade virtual. Afinal, ter crianças na escola não garante, necessariamente, o provimento de educação.
"Não basta colocar crianças na escola em larga escala, é preciso que elas permaneçam e tenham uma educação que seja relevante para a vida coletiva. Não só com capacitação técnica, mas com base em cidadania. Em segundo lugar, precisamos de uma nova qualidade de ensino, com uma estrutura mais voltada para o século 21", defendeu o filósofo, citando o choque entre alunos do século 21, professores do século 20 e metodologias do século 19.
É por isso que a escola ainda é mais vista por muitos alunos mais como um fardo do que como um passaporte para o conhecimento, aquele que seduz. Exceto pelos aspirantes a matemáticos ou engenheiros, quem é que nunca se fez a pergunta "quando é que eu vou usar isso na minha vida?", diante de uma equação? Talvez porque nunca tivesse sido mostrado o sentido ou o contexto daquilo. Esse detalhe fugiu da classe.
E trata-se de uma necessidade urgente, defendida pelo matemático russo Edward Frenkel. Em passagem por Portugal, declarou a um veículo daquele país (bit.ly/1TOiGNi) que uma das razões de muita gente ter uma relação traumática com a matemática é a ênfase na resposta, em vez de encorajar que os alunos sejam curiosos. Além disso, "a maioria dos conteúdos que são ensinados nas aulas de matemática têm mais de mil anos e isso é verdadeiramente escandaloso e seria impensável numa aula de Ciências. (...) Continuamos a repetir fórmulas antigas, sem estabelecer nenhuma ponte com o mundo atual".
Nas palavras de Frenkel, "a escola não expõe os alunos à verdadeira beleza da matemática". Assim como não deve ser tão fácil para muita gente se dedicar à química com um brilho no olhar digno daquele de Walter White, o professor e protagonista da série Breaking Bad. Ou sentir euforia na obrigação de ler Machado de Assis. Quem irá derrubar esse muro, e quando? O Enem, por exemplo, exige do candidato análise e raciocínio globais que não são regra no ensino público. É o governo cobrando aquilo que não garante em sala.
Ontem, em Limeira, cerca de 24 mil alunos voltaram às salas de aula da rede pública estadual. Começa o ano letivo sob um plano de educação, e quando a reorganização escolar ainda é uma dúvida entre a imposição e a aceitação que escorregam na falta de discussão. Inicia-se um ciclo que pode parecer banal. Mas também é dentro das salas que é determinado se, no futuro, registraremos mais casos de tráfico envolvendo adolescentes ou estudantes se destacando em pesquisas. Se alunos serão seduzidos ou reduzidos.

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