segunda-feira, 21 de março de 2011 | By: Daíza de Carvalho

Limeira se despede de Pinheiro Alves

Daíza Lacerda

"Sete horas, em Limeira. Bom dia! Lembre-se: se você agir com dignidade, você pode não consertar o mundo. Mas tenha a certeza de uma coisa: na Terra, haverá um canalha a menos".

Era com essas palavras que Rubens Pinheiro Alves, falecido no sábado, acordava e saudava seus ouvintes, durante as três décadas em que atuou em rádio. Além das boas vindas, dramatizava fatos em verdadeiras histórias que, “seguravam” os ouvintes.
Estas foram algumas das lembranças de suas filhas durante o velório do radialista, jornalista, colunista da Gazeta e ex-vereador, no fim da tarde de ontem, na Câmara Municipal. "O Homem da Verdade", como era conhecido pelo seu programa, transformava a frieza de informações de boletins de ocorrência em verdadeiras tramas, relembraram as filhas Glória, 42, Fabiana, 38, e Natália, 34. Viúvo, 76 anos, Pinheiro morreu às 16h de sábado. Deixou ainda os filhos Vera, Rita, Thiago, Benedito, Antônio, Roberto e Márcia, além de 15 netos e quatro bisnetos.

DE CICLISTA
A VEREADOR

O vereador eleito com a maior votação de Limeira (4.333, em 1982), começou a carreira como ciclista, como contam suas filhas. Nascido em Catanduva (SP), sua vida tomou outros rumos aos 30 anos, quando foi assistir um jogo de futebol em Araras. "Na época, o locutor do jogo faltou e ele assumiu o microfone para narrar. Gostaram tanto da voz dele, que o chamaram para fazer um teste na rádio daquela cidade", conta Glória. Pinheiro trabalhou com Gil Gomes, e garantia que o apresentador havia se apropriado de seu estilo de locução e o levou para a cidade grande, "fazendo sucesso às custas do Pinheirinho". Trabalhou ainda na Rádio Globo.
Nas ondas do rádio, atuava como repórter policial com tamanha popularidade que elegeu-se vereador uma segunda vez, depois do recorde municipal de votos.

COMBATIVO
NA CÂMARA

Na política, os companheiros de época são unânimes em lembrar seu perfil atuante e combativo, mas sem conquistar inimigos. "Ele era um vereador que se mexia, não era acomodado. Sempre atuante e combativo, trabalhador. Separava bem a política das amizades, pois não tinha inimigos", lembra Moacyr Camargo Silveira Filho, que atuou com Pinheiro na Câmara.
Outro vereador contemporâneo, Jurandir Bernardes frisa ainda o poder de oratória de Pinheiro, que se expressava muito bem. "Se ele podia, ajudava. Mas nunca atrapalhava. Era um lutador e muito dedicado. Foi uma figura folclórica em Limeira, que deixará uma lacuna no jornalismo. Agora fica a saudade, e as nossas considerações com a família", lamenta.

CÂMARA AÇÃO

Mantinha na Gazeta, há mais de 10 anos, a coluna "Câmara Ação", para a qual ficava ligado nas sessões da Casa. "Ouvia pelo rádio, antes de acompanhar também pela TV. Se havia uma discussão ou outra, já ia anotando para a coluna", contam as filhas. As observações do "pai dos pobres", como marcou sua legislatura, chegavam semanalmente à redação, datilografadas. "Ele odiava computador, mas com muito custo passou a usar, nos últimos meses", acrescentam.
Falta que fará não só aos leitores, mas aos demais amigos da redação. Roberto Lucato, diretor da Gazeta de Limeira, lamenta a perda. "Chamava atenção e pedia apoio das pessoas de bem numa época em que a Câmara era bastante ativa. Foi uma pessoa que lutou muito pelas causas de Limeira, mesmo não tendo sido filho desta terra", declara.

SEM INIMIGOS

Seu espaço na Gazeta era muito lido e esperado por seus colegas da Casa Legislativa, como a vereadora Elza Tank que, em 1982, foi a segunda colocada em número de votos, com o recorde de Pinheiro. Hoje presidente da Câmara, Elza lembra da marca alegre do amigo. "Estava sempre contente, mesmo diante de dificuldades. Trabalhava pelos mais humildes e, mesmo fora da Câmara, procurava atendimento às pessoas necessitadas. Fará muita falta a Limeira", diz ela, que aguardava suas colunas dominicais com comentários sobre a Casa e os vereadores. "Nunca foi agressivo, sempre foi respeitoso. Era um amigo de sempre".
Autoridades compareceram à Câmara para prestar condolências à família, entre vereadores, o ex-prefeito Pedro Teodoro Kühl e o prefeito Silvio Félix, que também lamentou a perda. "Era uma pessoa popular, e não se tem notícia de que tivesse inimizades. Ajudava no que podia e marcou sua vida por isso, na cidade que adotou", disse.

POPULAR

Muito lembrado pelas festas do Dia das Mães, promovido por ele e a já falecida esposa, Ditinha, em que arrecadavam alimentos e promovia alegria aos menos favorecidos, as filhas acentuam que ele jamais usou a política para ascensão material. "Entrou pobre e saiu paupérrimo. Era o que ele dizia", lembram. Seu sonho era voltar para a Câmara, tanto que tentou, sem apoio político ou financeiro, se eleger na última eleição. "Mesmo sozinho, entregando os próprios santinhos e fazendo a sua campanha, conseguiu mil votos".
A vida fértil deixa legado exemplar a parentes e amigos. Pinheiro foi internado na Medical no dia 10, em crise que se agravou na última semana. Vítima de enfisema pulmonar e fibrose, foi sepultado no final da tarde de ontem no Cemitério Parque, sob os cuidados da Funerária Limeirense.

Trajetória de vida

Em 1962, Pinheiro já era casado e pai de três filhos, morando em Pirassununga onde exercia a função de mestre de fundição e passou a integrar a equipe de ciclismo da Usina São João e se consagrou campeão do estado de São Paulo e representou o Brasil em competições internacionais. Na biografia da história da Usina São João, Pinheiro Alves é lembrado como o símbolo do esporte amador em toda a história do grupo Ometto.
Começou no rádio fazendo programa de saudades, das 22h às 24 horas, na rádio Centenário de Araras. Cinco meses depois da estreia como apresentador de programa de saudades, aconteceu um crime na cidade e a direção da rádio mandou Pinheiro fazer a reportagem. E ele contou: “Anotei todos os detalhes, peguei o histórico da mulher assassinada pelo marido. Cheguei ao microfone e comecei a contar a história... Sei que fui o primeiro narrador de histórias policiais, e sabem por quê? Achava que falando, por exemplo: ‘na Vila São Pedro, marido mata mulher a tiros...’, eu tirava o mistério da história e os ouvintes já ficariam sabendo quem morreu e quem matou”.
Em 1968 Pinheiro foi convidado a trabalhar na Rádio Jornal do Povo e ali encontrou nomes que hoje fazem ou fizeram parte da história do rádio da cidade, como João Valdir de Moraes, Reinaldo Grassi, Dario Romeu, Batista Petrelli, Amaro Cardoso, Edmundo Silva, Bigotto e Milton Pereira de Almeida. Até 1982, Pinheiro Alves comandava “Os Dramas da Cidade”, mas, ainda em 1979, diretores da Rádio Globo de São Paulo o ouviam e se interessaram. Ele venceu o teste para a vaga deixada por Gil Gomes, que acabara de se transferir para a Rádio Record.
A trajetória de Pinheiro Alves na Globo estendeu-se até dezembro de 1982 quando, a convite de Jurandyr Paixão, Elza Tank e Marco Cover, o radialista filiou-se ao MDB, hoje PMDB, e elegeu-se vereador com quase cinco mil votos, num colégio eleitoral de pouco mais de 50 mil eleitores. Pinheiro continuou no rádio e na década de 80, a convite de Francisco Altimari transferiu-se para a Rádio Educadora e ali ficou até se aposentar em 2003. Em outubro de 2008, recebeu da Câmara Municipal o Título de Cidadão Limeirense, em reconhecimento à sua atuação na área jornalística, social e comunitária. Na época, relembrou algumas histórias de sua carreira política. “Quando você está aqui [referindo-se ao cargo de vereador], você acha que é insubstituível. Mas isso não é a realidade”, disse, na ocasião.
Era colunista da Gazeta de Limeira havia mais de 10 anos. Em julho de 2009, foi um dos colaboradores homenageados pela Câmara Municipal, em prêmio dedicado à imprensa. (DL)

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