terça-feira, 19 de abril de 2016 | By: Daíza de Carvalho

Show de horrores

COLUNA RELEITURA - 19/04/2016

Show de horrores

Daíza Lacerda

Confesso que não tive estômago para assistir toda a votação do impeachment, mas, no que consegui, só pude concluir que os brasileiros têm, de fato, os governantes que merecem. Em rede nacional, o desfile das bizarras estirpes que colocamos no poder. Dos tipos que não conseguem conjugar um verbo àqueles cujas dedicatórias me lembraram o Xou da Xuxa na minha infância dos anos 80. Como pode a situação mais delicada da atualidade resgatar o que de mais banal e irrelevante eu guardava nos confins da memória?
A megalomania chegou a proporções tão surreais, que não nos demos conta da gravidade de ter um muro entre nós. Uma barreira erguida no meio da Esplanada dos Ministérios para separar os anti e pró-governo. Nem as torcidas organizadas do futebol, que deixam espancados e mortos pelo caminho, teriam feito melhor, pela obsessão ao time. No país dividido, a obsessão é pelas siglas, não pelo bem comum.
Em entrevista à Folha no último sábado, o Nobel de Literatura, o peruano Mario Vargas Llosa, defendeu que o interesse tem de ser no fortalecimento das instituições, no aperfeiçoamento das democracias. Considerou que, nos últimos anos, houve um populismo muito tolerante com a corrupção e que a "autocrítica que o Brasil está fazendo é terrível, mas muito necessária". Em minha humilde opinião, essa autocrítica está é muito torta, quando são tão massivamente aplaudidos os votos de tanta gente que tem muito a explicar, tanto quanto a presidente. Como é que se fortalece uma instituição à sombra da hipocrisia, como aceitar o julgamento daquele que é réu?
Sempre achei um desperdício mobilizações para jogos da Copa. A festa para alguns e fim de festa para outros no domingo durante e pós votação só serviu para mostrar como o termo fanfarrão se aplica ao brasileiro. Porque não se compara a decisão dos rumos políticos de um país com a de um jogo que, ao final, os jogadores ainda embolsam seus milhões e a nossa vida continua, ainda que com o ego abalado, prontos para o expediente amanhã. Desta vez, por mais que cervejas e petiscos distraíssem, no fim do jogo, foi a nossa moral em xeque. Só acho que essa mobilização toda deveria ser regra em dias de eleição, quando os protagonistas do jogo somos nós. Ainda temos a cultura de votar em qualquer um, no que que rouba mas faz, ou em fulano para não eleger ciclano, ou só na sigla mesmo para ver no que dá. Quem vota de acordo com a consciência, de verdade? Tipo votar em ninguém, se ninguém te inspirar confiança para representação em quaisquer esferas?
Quem é que tem razão para cobrar política decente depois de eleger figuras como as que vimos anteontem? Gente caricata que fez a alegria das redes sociais, mas que é cercada de todo o luxo que tem e não tem direito, bancado adivinha por quem?
Se não deu certo pela via reconhecidamente democrática, do voto, passar uma borracha na escolha não será mais promissor. Os culpados são eles ou nós?
A esta altura, não importa o lado do muro, quem colocou ou quem quer tirar. No jogo ardiloso que nos trouxe até aqui, todos saímos perdedores. Para você que também desperdiçou o seu voto anos a fio, aquele abraço.

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