sexta-feira, 15 de setembro de 2017 | By: Daíza de Carvalho

Setembro

Eu gosto de setembro porque é o mês que o sol começa a ficar mais um pouquinho, de tarde. Eu gosto de setembro, porque ele começa com o fim do desgosto de agosto, dá sumiço no frio que gela a alma e traz as cores da primavera. Eu gosto de setembro porque é o mês que nasci, é o mês que tiro férias e é o mês da padroeira Nossa Senhora das Dores, o que nos leva à comemoração do aniversário de Limeira.
No meu último treino de corrida, divaguei no que poderia virar um textão sobre o tema da edição especial da Gazeta de Limeira, que fizemos para os 191 anos da cidade que escolhemos ou aceitamos como lar. Abordamos o ensino superior e a forma que ele identifica a nossa cidade - ou não. Foi um esforço conjunto que pode ser conferido nas páginas hoje, mas me pergunto o que, de fato, os moradores de Limeira têm aprendido ou absorvido ao abrigar instâncias que têm o saber e o aprender como motivação.
Minha conclusão imediata foi de que falta muito para sairmos fora da caixa. Não de pensar fora da caixa, mas primeiro sair dela, mesmo. Limeira ainda tem uma mentalidade muito provinciana, talvez ainda não tenha se dado conta do quanto conhecimento tem à disposição. Da mesma forma, as faculdades também ainda não exploram, ao todo, essa possibilidade de conexão com a comunidade. São desenvolvidos trabalhos geniais, que na maioria das vezes não chegam ao conhecimento da própria imprensa, tampouco da população, senão por repórteres insistentes que cavam pautas.
Limeira ainda não é uma cidade genuínamente universitária não só porque tem uma rodoviária vergonhosa ou porque grande parte reluta em se misturar ao conhecimento propagado pelos cantos. Limeira ainda tem muito a avançar porque ainda falta esforço para enxergar à frente, o que é tristemente constatado em comentários de rede social. Ainda que isso não seja pressuposto para formular um diágnóstico, mostra muito de nós, enquanto comunidade.
Limeirenses têm que sair fora da caixinha quando chiam pelo aumento da tarifa de água e esgoto sem entender a estrutura que esse dinheiro vai subsidiar. As pessoas pensam que é só dar descarga para o problema acabar, e é fácil reclamar quando não se viveu um dia da vida sem saneamento decente. Nós temos e não damos valor. Não nos tocamos da complexidade ambiental que isso envolve, desde que a dor não seja no nosso bolso.
Limeirenses têm que correr pra fora da caixinha quando criticam o fim do aluguel caríssimo do Centro de Eventos, um acordo burro que durou até demais e ainda era pago com o meu e o seu dinheiro para abrigar um serviço que já não era oferecido há mais de um ano. Se gasta, o povo reclama. Se deixa de gastar, o povo reclama. Que tal focar as energias em fiscalizar se essa economia será decentemente aplicada?
Limeirenses têm que sair dora da ciaxa quando reclama do trânsito local. Que, sim, é horrível. Mas quem faz o trânsito somos nós! É fácil reclamar sem policiar as próprias atitudes.
Todo ano paramos para refletir a cidade em torno de um tema, em meio ao turbilhão de refleti-la com todos os problemas e soluções, diariamente, dentro do que é possível abraçar com nossas mãos, mentes e blocos de anotações. Não somos donos da verdade - nem queremos. Mas, como sempre repito: a gente gosta é de dar notícia boa.

Hoje é um dia que quero ser otimista, mesmo na falta de grandes expectativas em relação à nossa cidade ou país. E não é porque as minhas férias estão só começando. É porque nesta manhã li a coluna do Denis Russo Burgierman no Nexo (www.nexojornal.com.br/colunistas/2017/Todo-o-potencial-do-mundo), no qual ele se esforça para sair de uma onda de pessimismo em seus textos para um olhar menos apocalíptico sobre o nosso Brasil, tão desmilinguido, como descreve. Ele fala das crianças e de todo o potencial que elas têm, de fazer coisas, de transformar o Brasil em qualquer coisa - desde que as malas de dinheiro, como as do Geddel, sejam dedicadas a nutrir esse potencial. Independentemente disso, elas têm o talento nato da criação de mundos, ao menos até quando esse poder é ceifado pelas limitações que nós, adultos, insistimos em reproduzir. E essa observação é minha, não dele, embora no texto ele reconheça a nossa dificuldade em aprender coisas novas, mudar hábitos, em paredões que simplesmente não existem para as crianças (é a tal da plasticidade que perdemos enquanto nos "desenvolvemos").
Aí juntou esse texto, com a lembrança do filme da Mulher Maravilha, com algo que me ocorreu ontem. No filme, Diana é a criança que deveríamos ser. É uma heroína com o olhar que deveríamos ter. De não achar barbáries comuns e de enxergar as belezas que nos rodeiam, além das mazelas. Fato que me deixou maravilhada (trocadilho irresistível!) com o filme e me inspirou a escrever (http://reportareviver.blogspot.com.br/2017/06/precisamos-da-inocencia-de-diana-uma.html).

Ontem, inicialmente, fiquei um pouco chateada por ter uma cobertura a fazer no fim da tarde, no fim do expediente, nos 45 do segundo tempo antes de sair de férias (que na verdade começam na segunda, e não no feriado municipal de hoje ou folga de amanhã). Mas, como dizem as mães, o que não tem remédio, remediado está. Fui para uma inauguração de praça, no meio de um trânsito caótico, no qual acho que a maioria dos que passaram se deram mais ao trabalho de praguejar do que notar os coqueiros que ornamentavam a praça, na verdade uma rotatória, inacessível a pedestres.
O "tchan" da coisa seria ao escurecer, com a exibição da nova iluminação do local. Mas o sol insistia em ficar. O staff do prefeito estava tenso, na expectativa que tudo funcionasse, que as lâmpadas se acendessem ao esfriar do sol, que a sincronização de discursos, fotos, luzes naturais e artificiais transcorresse conforme o roteiro. Pois a luz das lâmpadas deram as caras, e o sol continuava ali, sem pressa.
Não fosse por isso, talvez eu não tivesse apreciado o por do sol no meu último expediente antes das férias. Mas, mais emblemático do que o espetáculo natural, foi o monumento da praça, registrando a sua construção em 6 de setembro de 1985, um pouco mais de um ano após eu vir ao mundo nesta terrinha. É um monumento que parece um banquinho. Assim eu via, pelo menos, com o meu olhar de criança, quando tudo era possível. Eu cabia sentadinha ali, num igualzinho àquele nos meus anos iniciais, quando as escolas infantis tinham nomes de desenhos, e não de pessoas.
O texto do Denis Russo me provocou a refletir o que aconteceu entre eu caber sentada naquele banquinho entre o fim dos anos 80 e início dos 90 e estar diante dele e do por do sol, à beira dos 33 anos de idade, com um pé na responsabilidade de entregar uma matéria no fechamento e o outro no barril de chopp do início das férias. Concluí que não adianta muito refletir sobre o que eu fiz ou deixei de fazer para melhorar meu mundo e minha cidade. Me senti desafiada a ser criança de novo, e olhar o mundo desapegada das restrições burras que adquirimos por osmose ou por imposição no decorrer da vida. Me senti desafiada a sair fora da caixinha. Agora. Amanhã. Durante as férias. No meu aniversário. Quando terminarem as férias. A cidade e o país que faremos/teremos é fruto de um esforço diário, que muitos de nós insiste em procrastinar.
Quando alguém faz aniversário, a gente automaticamente deseja tudo de bom. Pensamos no todo, no ano, no resto da vida, e nunca no dia de hoje, com o de amanhã e depois. Então eu só desejo que, todo dia, quando o sol se demorar ou se apressar a dar lugar à noite, a gente possa ter certeza de que fez, nas últimas horas, o possível para contribuir positivamente de alguma forma nas mudanças que inevitavelmente virão. Até estar longe, mas bem longe da caixinha que limita as nossas possibilidades.


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